Francisco chegou a aparecer na sacada da Basílica de São Pedro para a mensagem de Páscoa, na manhã de domingo
O Papa Francisco morreu às 7h35, horário de Roma, desta segunda-feira (21), no Vaticano, em Roma. O anúncio da morte foi feito pelo Camerlengo Farrell da Casa Santa Marta.
“Às 7h35 desta manhã, o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e da Igreja”.
O cardeal Farrell disse ainda que Francisco chegou a aparecer na sacada da Basílica de São Pedro para a mensagem de Páscoa, na manhã deste domingo (20).
“O Pontífice apareceu na sacada da Basílica de São Pedro para a mensagem de Páscoa Urbi et Orbi, deixando sua última mensagem para a Igreja e o mundo”.
“Com imensa gratidão por seu exemplo como verdadeiro discípulo do Senhor Jesus, recomendamos a alma do Papa Francisco ao infinito amor misericordioso do Deus Trino,” acrescentou o cardeal.
Primeiro Papa das Américas
Francisco assumiu o papado em 2013, mas, ao longo dos últimos anos, começou a apresentar problemas de saúde, desde gripes e resfriados até ferimentos provocados por quedas em seu próprio apartamento, no Vaticano.
Com a saúde cada vez mais fragilizada, chegou a usar cadeira de rodas e bengalas para se locomover em eventos que exigiam maior esforço físico, além de limitar suas falas em razão de diversas infecções respiratórias.
Em fevereiro, foi internado para realizar exames e tratar um quadro de bronquite, inflamação dos brônquios geralmente provocada por vírus como o da influenza ou o vírus sincicial respiratório.
Apesar do agravamento da saúde no decorrer dos anos, o papa vinha mantendo grande parte de sua agenda diária de compromissos, participando, inclusive, de reuniões em sua própria residência.
Biografia
Francisco, nome escolhido por ele para seu pontificado, nasceu Jorge Mario Bergoglio. Argentino de Buenos Aires, foi o primeiro papa das Américas. Filho de imigrantes italianos, era o mais velho de cinco irmãos: dois homens e três mulheres.
Ainda jovem, chegou a formar-se técnico em química, mas, pouco depois, escolheu o caminho do sacerdócio. Licenciou-se em filosofia, foi professor de literatura e psicologia e, posteriormente, licenciou-se também em teologia.
Foi ordenado sacerdote em dezembro de 1969, prestes a completar 33 anos. Já como padre jesuíta, foi nomeado bispo auxiliar de Buenos Aires e, posteriormente, em 2001, como cardeal, pelo então papa João Paulo II.
Como arcebispo de Buenos Aires, diocese com mais de 3 milhões de pessoas, elaborou um projeto missionário centrado na comunhão e na evangelização e com foco na assistência aos pobres e aos enfermos.
Francisco foi sucessor do papa emérito Bento XVI que, em fevereiro de 2013, aos 78 anos, renunciou ao pontificado em razão de problemas de saúde. Francisco chegou a presidir o funeral de Bento XVI, em janeiro de 2023, com uma homilia em que o comparava a Jesus.
Em meados de 2024, sobre a possibilidade de também ele renunciar, Francisco se referiu ao tema como “hipótese distante”, já que ainda mantinha saúde suficiente para seguir com seu papado. “Não tenho motivos sérios o suficiente para me fazerem pensar em desistir”.
Apelo por cessar-fogo
Ao longo de seu papado, Francisco lançou diversos apelos à comunidade internacional por cessar-fogo em conflitos na Europa e no Oriente Médio – incluindo a guerra entre Rússia e Ucrânia e, mais recentemente, os ataques do Hamas à Faixa de Gaza.
“Todas as nações têm o direito de existir em paz e em segurança e seus territórios não devem ser atacados ou invadidos. A soberania deve ser respeitada e garantida pelo diálogo e pela paz, não pelo ódio e pela guerra.”
Mulher em gabinete-chave da Igreja
Em janeiro de 2025, Francisco nomeou uma mulher para chefiar um importante gabinete do Vaticano, escolhendo a freira Simona Brambilla para dirigir o departamento responsável por todas as ordens da Igreja Católica.
Com a nomeação, pela primeira vez, uma mulher fica responsável por um dicastério ou congregação da Cúria da Santa Fé, órgão central de governo da Igreja Católica. Simona substitui o cardeal brasileiro reformado João Braz de Aviz.
Milagre na Amazônia
Em outubro de 2024, durante missa na Praça de São Pedro, Francisco proclamou a canonização do padre italiano José Allamano, fundador da congregação dos Missionários da Consolata, por um milagre que teria ocorrido na Amazônia brasileira.
Segundo a organização Consolata América, o milagre ocorreu em 1996, em Roraima, quando um indígena yanomami foi atacado por uma onça e apresentou um grave ferimento na cabeça. Um grupo de missionários teria invocado José Allamano pedindo a recuperação do rapaz, o que se realizou.
Mudanças climáticas
Em agosto de 2024, Francisco fez um de seus últimos alertas em prol da preservação do meio ambiente e exigindo uma ação global contra as mudanças climáticas. “Se medirmos a temperatura do planeta, isso nos dirá que a Terra está com febre. Ela está doente”.
“Precisamos nos comprometer com a proteção da natureza, mudando nossos hábitos pessoais e comunitários”, disse. “Os que mais sofrem com as consequências desses desastres são os pobres, aqueles que são forçados a deixar suas casas por causa de enchentes, ondas de calor ou secas”, completou.
Bênção para casais do mesmo sexo
Em dezembro de 2023, o Vaticano anunciou, em decisão histórica aprovada pelo papa Francisco, que padres podem istrar bênçãos a casais do mesmo sexo, desde que não façam parte dos rituais ou liturgias regulares da Igreja Católica.
Documento do escritório doutrinário do Vaticano destaca que tal bênção não legitima situações irregulares nem deve ser confundido com o sacramento do matrimônio, mas figura como um sinal de que Deus acolhe a todos.
O texto cita que padres “não devem evitar ou proibir a proximidade da Igreja com as pessoas em todas as situações em que elas possam buscar a ajuda de Deus por meio de uma simples bênção”.
*Com informações do Vaticano News
Papa Francisco será lembrado como o “papa da misericórdia”
O Vatican News, portal oficial do Vaticano, publicou um editorial na manhã desta segunda (21) afirmando que o Papa Francisco será lembrado como o “papa da misericórdia”. Francisco, o primeiro Papa das Américas, morreu na madrugada de hoje. Segundo o Vatican News, “se há uma mensagem que, mais do que qualquer outra, caracterizou o pontificado do Papa Francisco e está destinada a permanecer, é a da misericórdia”.
“Ele mudou a percepção que muitos tinham da Igreja. Ele deu testemunho da face materna de uma Igreja que se inclina sobre aqueles que estão feridos e, em particular, sobre aqueles que estão feridos pelo pecado”, afirmou o editorial assinado por Andrea Tornielli, jornalista e escritor italiano.
O editorial também frisou que Francisco trabalhou muitos temas, “em especial a preocupação com os pobres, a fraternidade, o cuidado com a Casa Comum, o firme e incondicional não à guerra. Mas o coração de sua mensagem, o que certamente causou mais impressão, é o chamado evangélico à misericórdia.”
Leia o editorial abaixo:
O Papa da misericórdia
“A misericórdia de Deus é a nossa libertação e a nossa felicidade. Vivemos da misericórdia e não podemos nos dar ao luxo de ficar sem misericórdia: ela é o ar que respiramos. Somos pobres demais para estabelecer condições, precisamos perdoar, porque precisamos ser perdoados”. Se há uma mensagem que, mais do que qualquer outra, caracterizou o pontificado do Papa Francisco e está destinada a permanecer, é a da misericórdia. O Papa nos deixou repentinamente nesta manhã, depois de ter dado a última bênção Urbi et Obi no dia de Páscoa, do balcão central da Basílica de São Pedro, depois de ter dado a última volta pela multidão, para abençoar e saudar.
Muitos temas foram abordados pelo primeiro pontífice argentino na história da Igreja, em especial a preocupação com os pobres, a fraternidade, o cuidado com a Casa Comum, o firme e incondicional não à guerra. Mas o coração de sua mensagem, o que certamente causou mais impressão, é o chamado evangélico à misericórdia. A proximidade e ternura de Deus para com aqueles que se reconhecem necessitados da sua ajuda. A misericórdia como “o ar para respirar”, isto é, do que mais precisamos, sem o qual seria impossível viver.
Todo o pontificado de Jorge Mario Bergoglio foi vivido sob o lema dessa mensagem, que é o coração do cristianismo. Desde o primeiro Angelus recitado em 17 de março de 2013 da janela do apartamento papal que ele nunca habitaria, Francisco falou da centralidade da misericórdia, lembrando as palavras ditas a ele por uma senhora idosa que foi se confessar quando ele tinha sido apenas ordenado bispo auxiliar de Buenos Aires: “O Senhor perdoa tudo… Se o Senhor não perdoasse tudo, o mundo não existiria”.
O Papa que veio “do fim do mundo” não fez mudanças nos ensinamentos da tradição cristã de dois mil anos, mas ao trazer de modo novo a misericórdia ao centro de seu magistério, ele mudou a percepção que muitos tinham da Igreja. Ele deu testemunho da face materna de uma Igreja que se inclina sobre aqueles que estão feridos e, em particular, sobre aqueles que estão feridos pelo pecado. Uma Igreja que dá o primeiro o em direção ao pecador, assim como Jesus fez em Jericó, convidando-se para ir à casa do pouco apresentável e odiado Zaqueu, sem lhe pedir nada, sem condições prévias. E foi por se sentir olhado e amado dessa maneira pela primeira vez que Zaqueu se reconheceu pecador, encontrando naquele olhar do Nazareno o impulso para se converter.
Muitas pessoas, há dois mil anos, ficaram escandalizadas quando viram o Mestre entrar na casa do publicano de Jericó. Tantas pessoas se escandalizaram nos últimos anos com os gestos de boas-vindas e proximidade do pontífice argentino em relação a todas as categorias de pessoas, especialmente os “pouco apresentáveis” e pecadores. Em sua primeira homilia em uma missa com o povo, na Igreja de Santa Ana, no Vaticano, Francisco disse: “Quantos de nós talvez mereceríamos uma condenação! E seria também justa. Mas Ele perdoa! Como? Com a misericórdia, que não apaga o pecado: é somente o perdão de Deus que o apaga, enquanto a misericórdia vai além. É como o céu: olhamos para o céu, tantas estrelas, mas quando o sol vem pela manhã, com tanta luz, as estrelas não podem ser vistas. Assim é a misericórdia de Deus: uma grande luz de amor, de ternura, porque Deus perdoa não com um decreto, mas com uma carícia”.
Ao longo dos anos de seu pontificado, o 266º sucessor de Pedro mostrou o rosto de uma Igreja próxima, capaz de testemunhar ternura e compaixão, acolhendo e abraçando a todos, mesmo à custa de assumir riscos e sem se preocupar com as reações dos simpatizantes. “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e suja por estar nas ruas” – escreveu Francisco na ‘Evangelii gaudium’, a road map de seu pontificado -, “do que uma Igreja doente por estar fechada e a comodidade de agarrar-se à sua própria segurança. Uma Igreja que não confia nas capacidades humanas, no protagonismo de influenciadores que só se referem a si mesmos e nas estratégias de marketing religioso, mas que se torna transparente para tornar conhecido o rosto misericordioso d’Aquele que a fundou e a faz viver, apesar de tudo, há dois mil anos.
É esse rosto e esse abraço que tantos reconheceram no idoso bispo argentino de Roma, que começou seu pontificado indo rezar pelos migrantes que morreram no mar em Lampedusa, e o terminou imobilizado em uma cadeira de rodas, dedicando todos os últimos momentos para testemunhar ao mundo o abraço misericordioso de um Deus próximo e fiel em seu amor por todas as suas criaturas.
*Com informações do Vaticano News