Por Guilherme Nascimento
O status mudou de copo.
Não é modinha.
É mudança de mentalidade.
Enquanto uns ainda associam diversão ao copo cheio, uma nova geração está brindando à presença, à saúde mental e à clareza.
E isso muda tudo: as festas, os cardápios, os rituais — e a própria noção de prazer.
Tem gente que ainda acredita que, pra se soltar, tem que se entorpecer. Mas o futuro está em outra frequência: mocktails, kombuchas, bebidas funcionais, ambientes inclusivos, festas “sober friendly”. Encontros onde o “ficar de boa” é o novo “ficar louco”.
E antes que digam:
“É julgamento”, “é caretice”, “é censura”…
Não, não é.
É sobre escolha.
É sobre lucidez sem opressão.
É sobre abrir espaço pra quem quer dançar sem acordar arrependido.
A geração Z está só mostrando que dá pra curtir sem precisar esquecer.
Mas essa história é mais antiga do que parece.
Desde as ceias dos povos antigos às festas populares brasileiras, a bebida sempre esteve lá: no cálice dos deuses, no copo do guerreiro, no bar do bairro. Ela celebrou nascimentos, vitórias, lutos, reencontros.
Faz parte da nossa memória coletiva.
A cerveja virou símbolo de brasilidade, quase uma extensão do corpo coletivo.
Mas cultura não é estática.
E tradição não é prisão.
Cultura se move. E se reconstrói.
E hoje estamos assistindo — sem muito alarde — a uma reinvenção do ritual.
A nova geração não quer julgamento.
Mas também não quer mais a ressaca.
Quer alternativas. Quer bem-estar.
Quer lembrar da noite anterior sem vergonha.
Quer viver intensamente — mas com consciência.
Os dados não deixam dúvidas:
Segundo Euromonitor e Mintel, o consumo de álcool entre jovens deve cair 20% até 2030.
O mercado de bebidas não alcoólicas e funcionais deve dobrar até 2034, superando os US$ 3,8 trilhões.
Enquanto o setor alcoólico cresce 1% ao ano, o de bebidas conscientes avança a taxas de 6% a 8%.
Grandes marcas já se movimentaram: Heineken 0.0, Budweiser Zero, Tanqueray 0.0, Seedlip, Ritual.
A Diageo, que produz Johnnie Walker e Guinness, comprou marcas especializadas em drinks sem álcool.
Festas com foco em sobriedade já são realidade em metrópoles do mundo — e ganham força no Brasil.
Mas essa transformação não pode virar arma de exclusão.
Bebe quem quer. Celebra quem quiser — como quiser.
O perigo está em transformar o novo em padrão e o velho em tabu.
O mesmo sistema que sempre celebrou o álcool com glamour, criminalizou outras substâncias até menos prejudiciais, como a cannabis, mesmo em contextos terapêuticos, medicinais ou culturais.
Esse texto não é militância.
É bússola.
É radar.
É um chamado à escuta.
A festa continua.
Mas agora ela vem em outras formas, outros copos, outras ideias.
E quem trabalha com cultura, gastronomia, eventos ou hospitalidade precisa se perguntar:
meu espaço acolhe quem quer estar lúcido?
minha marca entende que o prazer também muda de rosto?
meu negócio está pronto para entregar pertencimento sem intoxicação?
A geração nova não quer impor.
Quer ser respeitada.
Quer se divertir com saúde, com clareza, com liberdade.
A roda girou.
E quem ainda acha que só se diverte quem se embriaga…
pode acabar brindando — à própria irrelevância.
